Por João Alexandre Guimarães, bacharel em Direito e professor na Una Uberlândia*
Com a crescente digitalização da sociedade, as eleições têm se tornado um campo fértil para o uso de tecnologias avançadas, como a Inteligência Artificial (IA). Entre as diversas ferramentas disponíveis, as deepfakes, que utilizam IA para criar vídeos e áudios extremamente realistas, mas falsos, têm se destacado por sua capacidade de manipular a percepção pública.
Esta realidade coloca em xeque a integridade dos processos eleitorais, exigindo uma resposta urgente em termos de regulação e proteção dos dados pessoais.
As deepfakes representam um dos maiores desafios tecnológicos e éticos para as democracias modernas. A capacidade de manipular a realidade com precisão e de espalhar desinformação em larga escala pode minar a confiança pública e comprometer a integridade das eleições. A Lei Geral de Proteção de Dados é um passo importante na proteção dos direitos dos cidadãos, mas é apenas parte da solução.
A regulação específica do uso de IA em campanhas eleitorais, o fortalecimento das políticas de privacidade e a responsabilização das plataformas digitais são medidas urgentes para garantir que a tecnologia seja usada para promover, e não para destruir, a democracia. À medida que nos aproximamos de um futuro em que a manipulação digital se torna cada vez mais sofisticada, a sociedade deve estar preparada para enfrentar esses desafios com firmeza e clareza.
– Deepfakes: Uma Ameaça Real à Democracia: Utilizando algoritmos sofisticados, esses vídeos podem colocar palavras na boca de qualquer pessoa, criando situações que nunca aconteceram. Em um cenário eleitoral, onde a confiança do eleitor é essencial, a disseminação de manipulações digitais pode ter consequências devastadoras.
Um exemplo recente foi visto nas eleições presidenciais da Argentina, onde vídeos manipulados por IA foram amplamente utilizados para difamar candidatos e influenciar a opinião pública. Um dos vídeos mais polêmicos mostrava Margaret Thatcher, ex-primeira-ministra britânica, aparentemente apoiando um dos candidatos, criando uma narrativa falsa e inflamatória. Outro exemplo incluiu a manipulação de declarações sobre a Guerra das Malvinas, um tema extremamente sensível para o povo argentino. Essas manipulações não só confundem o eleitorado, mas também minam a confiança nas instituições democráticas.
A capacidade de criar essas falsificações com alta qualidade e de distribuí-las amplamente por meio das redes sociais transforma esses constructos digitais em uma ferramenta perigosa. Elas podem ser usadas para espalhar desinformação de forma rápida e com um impacto potencialmente irreversível, especialmente em períodos críticos como as eleições.
– A Importância da Regulação e o Papel da LGPD: A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) do Brasil, implementada em 2020, é uma resposta fundamental às crescentes preocupações com a privacidade e o uso indevido de dados pessoais. No contexto das eleições, a LGPD desempenha um papel crucial ao garantir que os dados dos cidadãos sejam tratados de forma ética e segura. A lei estabelece diretrizes claras para o uso de informações pessoais e impõe sanções severas para aqueles que violam essas regras.
No entanto, a LGPD precisa ser complementada por regulamentações específicas que abordem diretamente o uso de IA e deepfakes em campanhas eleitorais. A criação de uma legislação que imponha limites ao uso dessas tecnologias é essencial para proteger o processo eleitoral de manipulações que possam comprometer sua legitimidade. Além disso, é vital que haja uma colaboração internacional para enfrentar este desafio global, uma vez que essas imitações artificiais podem ser produzidas e distribuídas de qualquer lugar do mundo.
Outro aspecto crucial é o direito ao esquecimento, previsto na LGPD, que permite aos cidadãos solicitarem a remoção de dados pessoais que possam ser prejudiciais. Em um contexto em que vídeos falsos podem ser usados para atacar a reputação de candidatos ou influenciar eleitores, a aplicação desse direito se torna ainda mais relevante. O desafio, no entanto, é garantir que a remoção de conteúdos falsos seja eficaz e que a disseminação dessas quimeras digitais seja contida antes que cause danos irreparáveis.
– O Desafio Ético e a Responsabilidade das Plataformas: Além das questões legais, há um grande desafio ético relacionado ao uso de IA em eleições. As plataformas de redes sociais, onde a maioria das deepfakes é disseminada, têm uma responsabilidade crescente na identificação e remoção desse tipo de conteúdo. O uso de algoritmos para detectar esse tipo de conteúdo é uma medida necessária, mas ainda insuficiente. As plataformas precisam ser mais transparentes em suas políticas de moderação e mais rápidas na resposta a materiais fraudulentos.
A confiança do público nas informações que circulam online depende diretamente da capacidade dessas plataformas de agir de maneira eficaz contra a desinformação. Campanhas de educação midiática e iniciativas para aumentar a conscientização sobre os riscos das falsificações digitais também são essenciais. O eleitor precisa estar informado sobre como identificar conteúdos manipulados e entender o impacto que esses vídeos podem ter na formação de suas opiniões.
*Sobre o autor: João Alexandre é coordenador Adjunto na Una Uberlândia -Ecossistema Ânima, e doutorando em Direito pela Universidade de Coimbra (Portugal). Também é mestre em Direito da União Europeia pela Universidade do Minho (Portugal), associado do Instituto Brasileiro de Estudos de Responsabilidade Civil – IBERC, associado-fundador do Instituto Avançado de Proteção de Dados (IAPD), membro do Comitê Executivo do Laboratório de Direitos Humanos (LabDH) da Universidade Federal de Uberlândia, Pesquisador do Observatório Jurídico da Comunicação do Instituto Jurídico de Comunicação da Universidade de Coimbra, e membro do Grupo de Estudos em Direito e Tecnologia da Universidade Federal de Minas Gerais (DTEC-UFMG).
Sobre a Una: Com mais de 60 anos de tradição em ensino superior, o Centro Universitário Una, que integra o Ecossistema Ânima – maior e mais inovador ecossistema de qualidade de ensino do Brasil, oferece mais de 130 opções de cursos de graduação. Foi destaque na edição 2022 do Guia da Faculdade, iniciativa da Quero Educação com o jornal ‘O Estado de São Paulo’, com diversos cursos estrelados em 4 e 5 estrelas. A instituição preza pela qualidade acadêmica e oferece projetos de extensão universitária que reforçam seus pilares de inclusão, acessibilidade e empregabilidade, além de infraestrutura e laboratórios de ponta, corpo docente altamente qualificado e projeto acadêmico diferenciado com uso de metodologias ativas de ensino. A Una também contribui para democratização do Ensino Superior ao disponibilizar uma oferta de cursos digitais com diversos polos de educação.