Depois de adentrar o cargueiro espacial Nostromo e encarar uma criatura assustadora em “Alien: The Original Screenplay”, desbravar um mundo pós-apocalíptico entre o Cerrado e a Caatinga do Norte de Minas Gerais em “Contos da Calango” e dar vida à uma guerreira e rainha da Irlanda antiga em “Maeve Rising Warrior”, o roteirista e quadrinista Cristiano Seixas mergulha nas profundezas do oceano, no Rio de Janeiro dos anos 1920, em seu primeiro livro de terror psicológico fora dos quadrinhos e da animação, “O Luto Abissal”.
Publicada pela editora elo-horizontina Moby Dick (responsável pela nova versão da HQ “Pinóquio”), a obra narra a jornada do professor Jonas que, após cair em luto profundo pela perda de sua filha, é enviado pelo seu sogro para o outro lado do Atlântico para tratamento psiquiátrico. “Porém, Jonas nunca chega ao destino traçado, porque é arremessado ao mar e sugado às profundezas. Em meio ao delírio e às descobertas de seres grotescos nas fossas abissais, o professor busca entender se está em extrema loucura ou avançando aos horrores destas criaturas nunca vistas antes”, descreve Cristiano Seixas.
Segundo o autor, estava em seus planos trazer o luto, uma temática ainda estigmatizada, para um dos seus trabalhos, especialmente por uma razão pessoal. “Já há algum tempo queria me aprofundar no assunto de forma fantasiosa, até que veio a oportunidade, através do convite da Moby Dick, de abordá-lo em um projeto de terror, de uma forma mais dark e usando analogias”, conta.
Cristiano Seixas revela que a cidade e o período escolhidos fizeram todo o sentido para a narrativa. “A gente queria um momento alusivo ao crescimento industrial do Brasil, mas sem relação com a primeira ou segunda guerra mundial. A história transita pelo fundo do mar, hospício e mansões de europeus, então o Rio de Janeiro antigo, somado ao fato de ser uma cidade portuária, foi determinante para o enredo funcionar. Tudo isso casou muito bem com a arte do Alexandre Tso, amigo de longa data, ex-aluno da Casa dos Quadrinhos e parceiro de outras empreitadas, como em alguns projetos do estúdio Ghostjack e nos quadrinhos “Os Caras do Fahrenheit” e “Calango””, descreve.
Confira um trecho do livro “Luto Abissal”
“Ah. Mas o amor se mostra como temporal, muitas vezes feio, efêmero, egoísta, e outras vezes seus momentos mais belos passam despercebidos. É no luto que o vemos em retrospecto, o tanto que era abundante e não pronunciado. No luto vemos o belo e profundo amor que se foi, mas daí já é tarde demais. Sempre que sentirmos esse amor numa morte, revivemos as belas memórias como monstros de um pesadelo que nunca vai acabar. E quando a morte deste amor é nossa culpa, estes monstros que te envolvem são tudo que lhe resta. E nas profundezas desses amores perdidos, prefiro deixar os monstros me consumirem, do que perder as lembranças mais preciosas que tenho”.